domingo, 24 de agosto de 2014

Desenvolvimento da Psiquiatria


                       Basta uma olhada no "Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais" (quase mil páginas) para se ter uma ideia da complexidade do campo da psiquiatria. A dificuldade de diagnosticar doenças mentais e tratá-las remonta à bastante tempo atrás.

                        O temperamento humano já foi visto como uma mistura de humores básicos e doentes mentais já foram tratados como se estivessem possuídos por maus espíritos. Mas foi no fim do século XIX que sintomas de doenças mentais começaram a ser rotulados e sanatórios começaram a aparecer por toda a parte. A partir daí, e até os tempos de hoje, há uma grande discussão em torno do tratamento de doenças mentais.

                      Um experimento que demonstra o quanto a psiquiatria precisa evoluir e re-avaliar seus métodos foi o experimento conduzido por David Rosenhan em 1973 (recente!!). Ele e mais sete voluntários se internaram em diferentes hospitais alegando ouvir uma voz repetindo "thud". Mas assim que foram internados passaram a se comportar de forma perfeitamente normal e mesmo assim seu comportamento foi tido como anormal, e levou bastante tempo até que tivessem alta de fato. A classe psiquiatra desafiou Rosenhan a enviar mais pseudopacientes alegando que conseguiriam identificá-los. No mês seguinte, alegaram ter identificado 41 pseudopacientes, mas Rosenhan revelou que não enviou nenhum.

                   Mas, voltando a história.
                   No século XX, a busca por terapias para tratar distúrbios mentais levou também cientistas da época a quererem moldar o comportamento humano. Skinner foi um dos fundadores da psicologia behaviorista, que se baseia na ideia de moldar alguém por meio de recompensas e castigos.
                   O avanço da tecnologia, porém, levou à métodos mais invasivos. Em 1949 Egaz Moniz levou o prêmio Nobel por cortar os tratos que conectavam o lobo frontal com o córtex. Esse método, diziam, deixava os pacientes "mais calmos".

                  Apesar da chamada "psicocirurgia" ainda acontecer (por exemplo, retirar as amígdalas de indivíduos agressivos pois elas eram tida como causa desse comportamento) em 1950, esse metódos mais invasivos começaram a ser substituídos por substâncias psicoativas. A partir daí, o uso de remédios seria cada vez maior, e suas consequências nem sempre devidamente avaliadas.

                 Testes clínicos com depressão mostraram, por exemplo, que boa parte dos pacientes com depressão que estava recebendo placebo melhorava, enquanto parte dos pacientes que recebiam a droga de fato não apresentavam melhora, ou até mesmo pioraram.
                 O problema reside no fato de que a introdução de uma substância química no corpo leva à uma série de mudanças e as pessoas são diferentes bioquimicamente.

               A indústria de psicotrópicos (drogas que alteram nosso cérebro) está repleta de problemas. Primeiro que o corpo tende a se ajustar às drogas fazendo com que sejam necessárias doses cada vez maiores. Além disso, o tempo de uso de um remédio deve ser cuidadosamente escolhido para não levar ao vício. O maior problema, porém, está no fato de que várias substâncias são vendidas como se resolvessem uma gama enorme de problemas mentais fazendo com que pessoas no mundo inteiro usem-na sem a devida precaução. Hoje sabe-se que o Valium (utilizado bastante em 1970 e era receitado para problemas genéricos como estresse ou infelicidade) têm seus problemas e causa dependência. Um dos problemas dessas drogas é que nem sempre revelam as causas do problema, mas se limitam à diminuir a intensidade dos sintomas.

              Uma classe de remédios que recebeu grande atenção da indústria farmaceútica são aqueles que afetam o sistema da serotonina. Esses remédios se tornaram os favoritos para tratamento de depressão. Uma vantagem desse tipo de remédio é que é possível testar sua eficácia de forma mais objetiva. Mas, o interessante é que observou-se que pacientes que passam por uma psicoterapia muitas vezes têm o mesmo efeito no corpo que aqueles que receberam a medicação.

             O passo seguinte na indústria de fármacos foi o desenvolvimento de inibidores seletivos de recaptação de serotonina. O mais famoso deles é o Prozac. Essa droga passou a ser usada mesmo por pessoas que não eram diagnosticadas como clinicamente depressivas. A euforia não durou tanto, quando começaram a perceber que só um terço dos pacientes que usavam Prozac melhoravam, além de todos os efeitos colaterais.

            Enfim, podemos observar que a psiquiatria está longe de ser exata, e que o uso de remédios para tratar os chamados distúrbios mentais deve ser feita de forma extremamente cuidadosa. Afinal de contas, ninguém pode garantir que algum remédio prescrito hoje de forma irresponsável, pode ser dado no futuro como causador de uma série de problemas, e quem sabe até proibido.



Referência: Rose, S. (2006) O cérebro no século XXI: como entender, manipular e desenvolver a mente. São Paulo: editora Globo. (capítulo 9)

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