Então, hoje irei comentar um pouco sobre o texto dessa semana que é um trecho do livro "O Poder dos Quietos" da autora Susan Cain. Susan tem uma personalidade introvertida e já atuou como advogada e consultora de negócios, então, nesse livro ela discute as vantagens desse tipo de personalidade e questiona os valores do mundo empresarial moderno.
A introversão e a extroversão são um estudo de longa data e tradição, e é um dos temas favoritos dos psicólogos da personalidade. E por causa disso, há inúmeras pesquisas na área, e estas trazem dados muito interessantes sobre o assunto. Por exemplo, diz-se que entre 33% a 50% dos norte-americanos são introvertidos. Porém, mesmo com tanta prevalência na sociedade, há, nas pessoas, uma clara preferência pela ideia da extroversão. Pode-se dizer que há hoje em dia um Ideal da Extroversão, que diz que todos devemos seguir esse tipo de personalidade e todos devemos nos sentir confortáveis em ser o centro das atenções. Esse ideal está presente em diversas esferas da sociedade. Na escola, o aluno ideal é aquele que se comunica com todos da sala, e não se importa em trabalhar junto aos colegas. No trabalho, gostar de trabalhar em equipe e não se importar com reuniões constantes é praticamente pré-requisito para qualquer emprego. E graças à esse ideal, há uma grande subvalorização da personalidade introvertida, tão grande que pode até causar certa dor psicológica em quem a possui, pois, pode achar que tem algo de errado com ela.
A autora do texto, Susan Cain, diz possuir uma personalidade introvertida, e fala que sua primeira cliente foi ela mesma. Ao se formar advogada, teve que enfrentar situações que exigiam dela habilidades com as quais não se sentia confortável, como por exemplo, representar uma fábrica sul-americana a renegociar os termos de uma negociação com vários banqueiros e seus advogados. A partir desta experiência e de outras treinando pessoas em negociação, a autora pode adquirir um extenso conhecimento sobre os diversos tipos de personalidade, em especial, a personalidade introvertida.
Atualmente, há diversas definições possíveis para uma personalidade introvertida. Podemos olhar os tipos psicológicos de Carl Jung, por exemplo, ou definir extrovertidos a partir de características como tomar decisões rapidamente, se envolver em riscos, enquanto os introvertidos têm uma tendência ao trabalho centrado e concentrado. Mas uma forma mais interessante de definir introversão é defini-la em termos de "estímulos externos". A pessoa introvertida tem uma preferência por ambientes com pouco estímulo (exemplos de estímulos: muitas pessoas, uma festa barulhenta, etc). E, é interessante notar também que apesar de muitas vezes andarem juntas, introversão e timidez não são a mesma coisa. A primeira, já definimos: preferência por ambientes com baixo estímulo. A segunda seria um medo da desaprovação social e de possível humilhação social. E por último (neste parágrafo de definições), é importante frisar que não existe ninguém 100% extrovertido ou 100% introvertido. As pessoas são uma mistura de vários traços de personalidade e de história pessoal.
O ideal da extroversão presente na sociedade peca ao não reconhecer que a maioria das grandes invenções da humanidade vieram de pessoas introvertidas, trabalhando sozinhas. Para dar um exemplo, é citado o caso de Stephen Wozniak (que junto com Steve Jobs, viria a criar a Apple). Wozniak criou seu primeiro protótipo de PC trabalhando sozinho em casa lendo manuais de engenharia, e trabalhando até tarde da noite. Na sua autobiografia ("iWoz") ele, inclusive, dá esse conselho aos jovens: trabalhe sozinho.
Apesar de tantas pesquisas ressaltando as vantagens de uma personalidade introvertida, e as ligações desta com a criatividade (a solidão cria um ambiente de concentração necessário para a dedicação que tarefas complexas exigem), a sociedade foi e é organizada de forma à valorizar o trabalho em grupo acima de tudo. Esse tipo de ideia foi denominada "Novo Pensamento de Grupo", e este pensamento prega que as consquistas intelectuais vêm de um lugar sociável, e logo trabalhar em equipe é a regra em ambientes formais e educacionais. Algo que impulsionou essa ideia foi a Internet, pois pelo fato de uma variedade de coisas terem sido criadas colaborativamente (Wikipédia, por exemplo), faz-se a conexão (errada) de que em situações "físicas" também deve ser assim. Para que seja possível entender o valor do trabalho individual, podemos citar uma pesquisa feita com músicos de alto nível, e com músicos com um nível mediano realizado pelo pesquisador e psicólogo Anders Ericsson. O objetivo era verificar o que fazia os músicos de alto nível se destacarem tanto em seus campo. E o que se descobriu era que esses músicos passavam a maior parte de seu tempo praticando sozinhos. Nesse estudo solitário, eles identificavam onde estavam seus pontos fracos e podiam exercitá-los (diferente de quando se está em grupo, e só se reforça os pontos onde já se tem proficiência). Esse tipo de prática foi chamada de Prática Deliberativa. Até a tão consagrada ideia do brainstorming já foi alvo de pesquisa. E por incrível que pareça, os estudos demonstraram que realizar um "brainstorming" sozinho rende mais e melhores ideias do que quando realizado em grupo. As razões para isso (e podemos confirmar hoje em dia por meio dos aparelhos modernos da medicina) é que o medo da desaprovação social é algo muito forte, e mesmo com as técnicas formais de brainstorming para evitar julgamentos dos colegas, este medo ainda continua presente.
Enfim, o que este texto nos alerta é que essas ideias tão presentes na sociedade como o Ideal de Extroversão e o Novo Pensamento de Grupo, não são apoiadas pelos pesquisadores. Claro que comunicação em uma empresa é importante, assim como incentivar o convívio entre alunos de uma instituição de ensino, mas o que não pode ser feito é uma subvalorização do trabalho individual. E um preconceito com pessoas que tenham uma personalidade com tendência à introversão pode ser muito prejudicial, pois grandes ideias costumam vir delas.
Referência: Cain, S. (2012) O poder dos quietos. Rio de Janeiro: Agir.