segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Psicose Maníaco Depressiva


                           Hoje, irei comentar o texto de uma aluna de enfermagem que relata sua experiência ao acompanhar uma paciente com transtorno bipolar.
                           A psicose maníaco depressiva (transtorno bipolar) é um quadro em que a pessoa irá oscilar entre diferentes estados mentais. Na fase "maníaca", o paciente tende à apresentar um humor aparentemente melhor, uma euforia muito grande, ideias "grandiosas" e pensamento acelerado. Em uma fase "mista" o paciente parece passar por uma fase de aparente tranquilidade (nos pacientes de ciclagem rápida, não há essa fase). E finalmente, a fase "depressiva" em que a pessoa de sente desinteressada e desanimada, tem pensamentos tristes, e ideias de suicídio.
                         De qualquer forma, apesar de ser importante dar uma ideia do quadro bipolar, a ênfase do texto não está no quadro de doença mental e sim na relação cuidador-paciente e nos sentimentos do cuidador. É importante, por exemplo, que o enfermeiro seja compreensivo com o paciente, estimule a expressão de suas ideias e opiniões. Podem ser utilizadas técnicas terapêuticas também para facilitar o processo de comunicação. E sempre valorizar qualquer progresso do paciente, ajudando-o a tomar decisões.
                        Nesse processo de cuidar de um paciente bipolar, o cuidador enfrenta um série de dificuldades. Na fase "maníaca", a agressividade e agitação do paciente dificulta seu tratamento e ele deve ser colocado em locais com pouco estímulo. Na fase depressiva, há um desânimo e falta de cooperação do paciente, e para garantir sua segurança é preciso tentar socializá-lo.
                         A autora do texto relata a experiência em que teve ao tratar uma senhora de 61 anos portadora de psicose maníaco depressiva. Ela foi internada depois de ser observada vagando à noite por um rodovia batendo nas janelas das casas que encontrava. O primeiro contato da aluna de enfermagem com a paciente foi em uma fase depressiva, em que a paciente andava cabisbaixa e devagar, e pouco interagia. Então, a estudante utilizou técnicas terapêuticas do tipo verbalizar interesse e aceitação, chamá-la pelo nome e repetir suas últimas palavras. Já na fase seguinte (maníaca) a paciente ficava alegre e falava com qualquer um que encontrava, andava rápido, ficava inquieta, falava vários assuntos ao mesmo tempo, tinha insônia e uma desorientação no tempo/espaço. A estagiária em enfermagem também utilizou técnicas terapêuticas para ajudar no processo de cuidar da paciente, do tipo impor limites e pedir que a paciente explicasse mais seus assuntos. Portanto, há dificuldades em ambas as fases. Na primeira (depressiva) é difícil interagir com o paciente, além de que a depressão deste tende a afetar a equipe que está tentando ajudá-lo. E quando muda-se de fase, há um sentimento de que é preciso começar tudo de novo, pois os sintomas mudam drasticamente.
                       Enfim, o que o texto mostra é que cuidadores também passam por várias dificuldades ao tratar pacientes, independente de qual seja seu diagnóstico. Sentem desânimo, impaciência, irritação. Além disso, o texto demonstra que o processo de comunicação é muito importante pois é por meio deste que o paciente irá expressar seus sentimentos e ideias e assim fica mais fácil traçar um plano individual de melhora. E por fim, esse trabalho demonstra que quanto mais um profissional lida com pessoas, mais psicologia está envolvida. É claro (depois de um ler texto desse pelo menos!!) que um profissional de enfermagem acaba entrando em contato com ideias de psicologia para melhorar seu trabalho e também para lidar com seus próprios sentimentos. Mas qualquer que seja a profissão, tendo fator humano envolvido (quase todas!!!) um pouco de psicologia é sempre bem vindo.

Referência: Martins, L.M.M. (1999) Assistência de enfermagem a pacientes com desordem bipolar e sentimentos da estudante de enfermagem: estudo de caso. Revista da Escola de Enfermagem da USP, 33, 421-427.

domingo, 21 de setembro de 2014

Curva gaussiana & Carl Rogers


                    O primeiro texto que irei comentar hoje é um boletim do Instituto de Física da USP em que se compara uma avaliação por critério e uma avaliação por norma (utilizando a famosa curva gaussiana).
                    Quando um professor utiliza a curva gaussiana para avaliar seus alunos, ele está comparando cada aluno com a média da turma. O problema, propõe o professor que escreveu o boletim, é que fazendo uso dessa forma de avaliação o docente não consegue aferir se o aluno realmente aprendeu o que deveria em um determinado módulo, por exemplo. A alternativa, então, seria uma avaliação por critério, em que o aluno seria avaliado individualmente e sua nota seria proporcional ao quanto ele demonstrou saber do conteúdo ministrado.
                    Para reforçar a tese, o boletim cita uma pesquisa educacional feita com alunos de física em que estes tinham que resolver uma série de experimentos. O diferencial da pesquisa era liberar o parâmetro tempo dos alunos, além do material de ensino (auto-instrutivo) ser de alta qualidade. Quando analisaram os resultados, observaram que a maior parte dos alunos tinha tido resultados excelentes. Essa pesquisa demonstrou que se o fator tempo fosse mais flexível, os alunos conseguiriam demonstrar melhor seus conhecimentos.
                   Na minha opinião, esse texto põe em evidencia uma ideia importante que é a ideia de que há um incompetência por parte do sistema de ensino em avaliar adequadamente o aluno (a pesquisa demonstrou que com bons materiais, e com tempo adequado, os alunos conseguem ir bem). Porém, o texto peca ao ser muito tendencioso para o lado da avaliação por critério. O professor parte da premissa que uma avaliação que use a curva gaussiana não está sendo adequada em termos de estratégia de ensino, e uma avaliação por critério seria então mil maravilhas. Mas basta uma olhada em qualquer instituição de ensino para ver que isto não é verdade. Uma avaliação que utilize curva gaussiana pode inclusive proteger o aluno da incompetência de docentes que não têm habilidade em ensinar e muito menos em avaliar alunos. A curva gaussiana, avaliando sempre a média da turma, evita problemas do tipo um professor cobrando a matéria de uma forma que não condiz com o que ensinou. Além disso, não é por que utiliza-se a curva gaussiana que a estratégia de ensino necessariamente é rígida. Pode-se também liberar o parâmetro tempo, por exemplo, nessa forma de avaliação.
                 Enfim, o problema educacional é muito maior do que a forma de avaliação de ensino utilizada. Uma avaliação por critério definitivamente não garante uma boa estratégia de ensino. Muito antes de estudarmos formas de avaliação de alunos, é preciso ir até a raíz do sistema de ensino e corrigir suas falhas. Aí então, poderemos discutir se a curva gaussiana deve ser utilizada ou não.

Referência: Dib, C.Z. (2002) Afinal, o que você efetivamente mede quando sua avaliação é referenciada pela distribuição normal ? Boletim informativo do instituto de Física da USP. http://www.if.usp.br/bifusp/bifold/bif0218.html
                   

                     Bom, o outro texto que vou comentar aqui é um texto que expõe as ideias do psicólogo americano Carl Rogers, com ênfase em suas ideias sobre educação.
                     Carl Rogers foi um psicólogo americano que desenvolveu um método terapêutico chamado "Abordagem Centrada na Pessoa". Essa abordagem segue uma série de conceitos em que a ênfase está na pessoa sendo avaliada e não no avaliador. Esse método segue conceitos que dizem que há um tendência da personalidade humana ao bem estar, ao desenvolvimento das suas potencialidades. Ou seja, o indivíduo tem recursos e autonomia para alterar suas atitudes. Além disso, essa abordagem também diz que a forma em que se dá o processo de comunicação entre os indivíduos também é importante para que haja um crescimento pessoal. Aceitar as opiniões individuais, se colocar no lugar do outro, ser autêntico na relação leva aos participantes do processo de comunicação à aceitaram a si mesmos, descobrir seus objetivos e traçar metas realistas para alcançá-los.
                     É fácil de ver que esta abordagem pode ter valor em outras áreas também, não só na psicologia clínica. E então, nasce a "Abordagem Centrada no Aluno". Aqui, é proposto que a ênfase do sistema de ensino saia da figura professor e passe para o aluno. O foco deve ser facilitar o processo de aprendizagem e crescimento pessoal e não um ensino copia-reproduz que se observa na maioria esmagadora das instituições de ensino. O assunto deve ser relevante ao aluno ("há uma tendência do indivíduo de desenvolver suas potencialidades"). O aluno deve participar ativamente do processo de ensino. E para todas essas ideias funcionarem adequadamente o professor deve ser um facilitador de aprendizagem, seguindo os conceitos de uma relação de comunicação saudável. Ou seja, o professor deve ser autêntico (mostrar-se como pessoa), aceitar o aluno e suas opiniões, compreender o aluno. Enfim, aprendizagem deve ser um processo em que o o professor é um orientador e que deve facilitar o crescimento do aluno como indivíduo.
                     É triste de comparar as ideias de Carl Rogers com a forma como a aprendizagem é tratada normalmente (professor sendo uma figura de autoridade e alunos repetindo conhecimento). A forma tradicional de ensino está ultrapassada e conceitos como estes poderiam aumentar o gosto dos alunos por aprendizagem. Algum dia, uma mudança tem de acontecer.

Referência: Capelo, F.M. (2010) Aprendizagem Centrada na Pessoa: Contribuição para a compreensão do modelo educativo proposto por Carl Rogers Revista de Estudos Rogerianos, A Pessoa como Centro, no. 5.

domingo, 14 de setembro de 2014

Baixo desempenho escolar


                    Olá visitantes do blog, hoje irei comentar um estudo feitos por alunos do Mestrado em Psicologia da UFPE. Esse estudo tem como objetivo buscar as origens de um baixo desempenho escolar (com enfoque em classes sociais mais baixas).
                    Quando se fala em baixo desempenho escolar, há uma série de estudos que foram feitos sobre o assunto, e cada um com uma linha de pensamento diferente. Temos estudos que associam um fracasso escolar à uma privação cultural que culminaria em uma deficiência cognitiva no futuro. Há os estudos que associam um baixo desempenho escolar ao fato de uma desvalorização do estudo em classes sociais mais baixas, pois o trabalho precoce é comum nesse setor da sociedade. Há ainda os defensores do argumento de que o próprio sistema favorece classes sociais mais altas (colégios particulares vs colégios públicos, por exemplo). Mas, uma linha de pensamento que não tem tantos adeptos é  a linha que diz que o fracasso escolar vêm da escola em si, que não consegue se adaptar aos diferentes tipos de estudantes. Com os dados deste estudo, essa última linha de pensamento ganha muita força.
                     O estudo consistiu em observar o desempenho de crianças de classes sociais mais baixas em testes de matemática. Mas o que diferencia este estudo de outros similares é que aqui, foram aplicados dois tipos de teste, o formal e o informal. No teste informal, as crianças são expostas à perguntas de matemática que estão inseridas em um contexto (por exemplo: "se 3 sucos são 35, quanto são 10 sucos?"). No teste formal, essas crianças são expostas às mesmas perguntas mas colocadas em forma de operações secas do tipo "quanto é (35 / 3) x 10?". Os resultado são impressionantes! As crianças acertam muito mais as questões do teste informal, ou seja, o contexto é um fator importantíssimo ao se aferir a capacidade (nesse caso aritmética) de um aluno. Além disso, essas crianças de classe social mais baixa, também demonstraram ser muito melhores em realizar contas de cabeça (dividindo o problema em sub-problemas por exemplo) do que escrevendo essas contas em papel e escrevendo um numero embaixo do outro, fazendo vai-um, etc. Ora, na escola são avaliadas de que forma? Com operações secas e tendo de escrever em papel e de realizar contas de formas não intuitivas!
                     Esse estudo indica que as escolas não conseguem realmente aferir a capacidade real dos estudantes. Ensinando de forma estática e  não-natural, estudantes de classe social mais baixa podem ser tidos como tendo uma baixa capacidade escolar, quando na verdade só estão acostumados à uma forma diferente de pensar. A escola costuma ensinar operações matemáticas secas e tenta depois inseri-las em contextos. Seria muito mais produtivo fazer o contrário.

Referência: Carraher,T.N., Carraher, D.W. e Schliemann (1982) Na vida dez, na escola zero. Cadernos de Pesquisa, 42,79-86 

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Sobre o tato e sobre o tédio


                        Nosso sistema sensorial é a parte do nosso corpo responsável pelo processamento de informações sensoriais. Para isso, é necessário traduzir as percepções do mundo físico para a mente. É então que entra o conceito de sentidos (visão, audição, tato, paladar e olfato). Mas, apesar de conhecermos bem os cinco sentidos, quando pensamos em áreas de pesquisa, o último que consideramos é o sentido do tato (os primeiros sendo visão e audição). Podem ser citados vários motivos para poucos pessoas no mundo estudarem o tato, mas o fato é que a sociedade poderia melhorar muito tecnologicamente se mais pesquisadores se dedicassem à essa área.
                        Como exemplo de tecnologia criada a partir do estudo do tato, pode-se citar o macacão táctil de pilotagem criado por Angus Rupert (médico da NASA). Com essa "roupa", o piloto recebe informação tátil sobre o ambiente (altitude, inclinação) e reage instintivamente aos "pulsos". Com essas informações, a pilotagem fica bem mais segura pois o piloto não depende apenas de informações visuais. Esse tipo de tecnologia aliado à tecnologia de radares também pode ser incorporado em veículos terrestres para avisar o motorista quando algo estiver muito próximo do veículo. Além disso, essa tecnologia pode ajudar deficientes visuais à se guiar, e à deficientes auditivos (o cérebro pode ser treinado à receber sons pela pele!)
                        Enfim, o sentido do tato pode trazer uma série de benefícios para sociedade. Mas por não ser uma área tradicional de pesquisa (além da falta de uma grande indústria que apoie esse desenvolvimento), cria-se uma barreira para inovações tecnológicas que poderiam mudar nossas vidas.

Referência: Schrope, M. (2001). O novo sentido do tato, New Scientist, 2 de Junho, 30-33.


                        O outro texto que eu li essa semana é o texto "Patologia do Tédio". Esse texto também trata de uma área de pesquisa não-tradicional: o tédio. Como nosso corpo reage à momentos de monotonia? 
                         Pesquisadores perceberam que organismos param de responder à estímulos repetitivos após um certo tempo. Em um experimento, pediu-se para pessoas observarem um ponteiro e pressionassem um botão sempre que o ponteiro desse um pulo duplo. A eficiência dos participantes do experimento diminui depois de meia hora!. Em outro experimento (mais complexo) os participantes usaram visores, luvas e travesseiros para evitar estimulação perceptual e foi feito uma série de testes para observar seus desempenhos antes e depois do experimento. Os resultados foram impressionantes. Primeiro, observou-se que as pessoas que estavam participando do experimento tinham uma capacidade de concentração bem menor depois de um tempo de monotonia. Além disso, vários participantes relataram que estavam sofrendo alucinações. E vários se diziam confusos após o experimento.
                         Esse tipo de pesquisa demonstra que nosso cérebro depende de estímulo constante para funcionar corretamente e mostra que para nos sentirmos com energia precisamos estar envolvidos em atividades que consideremos interessantes. 
                         Estudos como esse também podem servir como fonte de explicação para alguns acidentes envolvendo motoristas de caminhão ou pilotos que após muito tempo realizando a mesma atividade monótona relatam ter tido algum tipo de alucinação que fez com que fizessem movimentos abruptos e que não fariam caso estivessem tão concentrados quanto estavam no começo do percurso. 

Referência: Heron, W. (1977) A patologia do tédio. Psicobiologia: as bases biologicas do comportamentoRio De Janeiro: LTC.