domingo, 16 de novembro de 2014

Contexto e Adicção

                       O texto dessa semana aborda a questão do vício em substâncias químicas, específicamente cocaína. Para isso, primeiro é dado uma visão geral da droga e seus efeitos, e depois uma ideia geral das propostas terapêuticas existentes para tratar desse quadro, destacando a importância da análise do contexto de uso da droga.
                      Antes restrita à segmentos da sociedade de alto poder aquisitivo, a cocaína se popularizou (parte devido ao uso do "crack", substância derivada) e agora seu uso se espalhou por classes variadas da população. Essa rápida expansão torna importantíssimos estudos como este para entender como ocorre a transição entre o uso controlado de uma substância para a perda de seu controle e como tratar da situação. O assunto é complexo por que um vício é uma mistura de uma série de fatores, tais como fatores bioquímicos, familiares, econômicos. Além disso, o contexto de uso da droga também é uma características que deve ser estudada pois pode ser importante na criação de efeitos pré-ingestão da substância.
                     Os efeitos da cocaína são variados, mas de modo geral, pode-se dizer que há uma fase inicial de euforia, hiperatividade, sudorese, agitação que será seguida posteriormente de uma fase de depressão ou disforia. Quando administrada repetidamente, essa substância produz uso compulsivo. Chama-se tolerância a necessidade de aumentar a dose para se obter o mesmo efeito que ela outrora produzia. E dependência seria a perda de controle sobre a ingestão. O que impulsiona o uso repetido da substância são denominados de reforço. O reforço positivo é o efeito da euforia citado anteriormente. E o reforço negativo são as alterações químicas que levam à um desconforto quando a droga é retirada do sistema e que é aliviado com o uso subsequente.
                    Há diferentes possibilidades de se analisar o vício. No passado era tratado simplesmente como um ato ilegal e posteriormente foi tratado como doença. Hoje sabe-se que é um quadro complexo, com alterações químicas (tolerância, reforços) e influências do ambiente. Sabe-se por exemplo, que acontece uma antecipação dos efeitos da droga na presença de eventos associados em um uso passado da substância. Descobriu-se que os chamados "sinais de contexto" já são suficientes para que dependentes mostrem desejo pela droga. Estes resultados têm grande influência no tratamento clínico desse quadro.
                    As formas de tratamento atuais diferem significativamente pois há diferentes arcabouços teóricos para lidar com o assunto. Por exemplo, há uma teoria motivacional que trabalha com diferentes estágios de motivação, e diz que para saber se um tratamento terá sucesso ou não, deve-se avaliar em qual desses graus de motivação o paciente se encontra. Outro modelo é o comportamental que irá entender o vício como decorrente da relação do organismo com o seu ambiente (comentado no parágrafo anterior). O interessante desse modelo é que entendendo a influência do ambiente é possível criar mais formas de tratamento como por exemplo, expor o paciente a pequenos estímulos do ambiente sem a droga para que ele aprenda a evitar a recaída.
                    Enfim, o texto dessa semana foi só a introdução de um estudo feito por uma aluna de psicologia sobre o assunto. Nessa pesquisa ela irá focar nesse aspecto dos complexos sinais de contexto que precedem imediatamente o uso da droga e também sinais que ocorrem bem antes do uso.

Referência: Almeida, A.M.C. (2008) Complexidade de associações de estímulos condicionais de occasion setting do contexto do uso de droga com abstinentes de cocaína: uma interface entre o laboratório e a clínica. Universidade de São Paulo: tese de doutorado.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Temperamento e Personalidade


                                 O texto dessa semana é uma continuação do tema da semana passada. Trata-se ainda do livro da Susan Cain "O Poder dos Quietos", mas agora o trecho refere-se à capítulos que tratam sobre temperamento e personalidade. A questão à ser estudada é até onde a introversão de uma pessoa se deve à fatores genéticos e quanto o ambiente pode afetar essa personalidade.
                                 Primeiro, é necessário definir a diferença entre temperamento e personalidade. O primeiro refere-se à nossa tendência genética de ter uma ou outra personalidade. A segunda ideia (personalidade) é bem mais complexa, pois envolve tudo ao nosso redor que nos influencia, como o ambiente em que vivemos, a cultura em que estamos inseridos. Logo, identificar quanto da nossa personalidade se deve à nossa genética não é uma tarefa fácil. Um dos cientistas que se aventurou nessa área foi Jerome Kagan, que, junto com sua equipe analisaram bebês e suas reatividades à estímulos (parte referente ao temperamento) e que acompanharam o desenvolvimento deles, e observaram que tipo de personalidades desenvolveram. O resultado, por mais que pareça contraditório, é que bebês altamente reativos têm uma tendência à terem personalidades introvertidas. Uma possível ideia é que as pessoas mais reativas teriam mais sensibilidade às novidades que aparecem na vida, sendo dessa forma, mais cautelosos de uma forma geral. A ideia de que crianças altamente reativas são afetadas mais fortemente por qualquer tipo de experiência (negativa ou positiva) chama-se Hipótese da Orquídea. De acordo com essa ideia, uma criança altamente reativa teria mais chance de desenvolver problemas caso enfrentasse ambientes negativos, mas por outro lado, caso cresça em um ambiente saudável, tem um potencial de desenvolvimento maior do que as crianças menos reativas.
                               Esse estudo de Kagan traz um resultado interessante, mas com tantas influências genéticas e ambientais, ainda estamos longe de uma resposta definitiva (se é que existe uma). Por exemplo, por mais que os defensores da influência do ambiente insistam que a genética pode não influenciar tanto assim, há uma tendência das pessoas que têm um certo temperamento buscar atividades que reforcem aquele temperamento, desenvolvendo uma personalidade estimulada pela nossa genética.
                               Então, a questão que fica é: apesar da genética e temperamento, até onde conseguimos moldar nosso comportamento? Bom, precisamos ainda de muita pesquisa na área, mas um grupo de cientistas que continuou a estudar a ideia de alta e baixa reatividade observou que os traços dessas reatividades continuaram na fase adulta, mesmo que as vezes o controle sobre si mesmo seja tão forte que pareça que eles desapareceram. A ideia desse experimento é que conseguimos moldar bastante nosso comportamento, mas nossa genética, lá no fundo, sempre terá importância.
                              O interessante dessas pesquisas, é que conhecendo essas ideias sobre personalidades e temperamentos, podemos adaptar nossos ambientes para que sejam mais agradáveis (já fazemos isso inconscientemente, mas sabendo disso podemos melhorar ainda mais). Se uma pessoa sabe que é introvertida, pode moldar a casa de tal forma que fique em um lugar com menos estímulos, por exemplo. Pode buscar empregos que tenham características que lhe agradem. É mais uma forma em que o auto conhecimento leva à melhorias pessoais.

Referência: Cain, S. (2012) O poder dos quietos. Rio de Janeiro: Agir. (capítulos 4 e 5)

domingo, 26 de outubro de 2014

O ideal da extroversão


                                    Então, hoje irei comentar um pouco sobre o texto dessa semana que é um trecho do livro "O Poder dos Quietos" da autora Susan Cain. Susan tem uma personalidade introvertida e já atuou como advogada e consultora de negócios, então, nesse livro ela discute as vantagens desse tipo de personalidade e questiona os valores do mundo empresarial moderno.
                                   A introversão e a extroversão são um estudo de longa data e tradição, e é um dos temas favoritos dos psicólogos da personalidade. E por causa disso, há inúmeras pesquisas na área, e estas trazem dados muito interessantes sobre o assunto. Por exemplo, diz-se que entre 33% a 50% dos norte-americanos são introvertidos. Porém, mesmo com tanta prevalência na sociedade, há, nas pessoas, uma clara preferência pela ideia da extroversão. Pode-se dizer que há hoje em dia um Ideal da Extroversão, que diz que todos devemos seguir esse tipo de personalidade e todos devemos nos sentir confortáveis em ser o centro das atenções. Esse ideal está presente em diversas esferas da sociedade. Na escola, o aluno ideal é aquele que se comunica com todos da sala, e não se importa em trabalhar junto aos colegas. No trabalho, gostar de trabalhar em equipe e não se importar com reuniões constantes é praticamente pré-requisito para qualquer emprego. E graças à esse ideal, há uma grande subvalorização da personalidade introvertida, tão grande que pode até causar certa dor psicológica em quem a possui, pois, pode achar que tem algo de errado com ela.
                              A autora do texto, Susan Cain, diz possuir uma personalidade introvertida, e fala que sua primeira cliente foi ela mesma. Ao se formar advogada, teve que enfrentar situações que exigiam dela habilidades com as quais não se sentia confortável, como por exemplo, representar uma fábrica sul-americana a renegociar os termos de uma negociação com vários banqueiros e seus advogados. A partir desta experiência e de outras treinando pessoas em negociação, a autora pode adquirir um extenso conhecimento sobre os diversos tipos de personalidade, em especial, a personalidade introvertida.
                              Atualmente, há diversas definições possíveis para uma personalidade introvertida. Podemos olhar os tipos psicológicos de Carl Jung, por exemplo, ou definir extrovertidos a partir de características como tomar decisões rapidamente, se envolver em riscos, enquanto os introvertidos têm uma tendência ao trabalho centrado e concentrado. Mas uma forma mais interessante de definir introversão é defini-la em termos de "estímulos externos". A pessoa introvertida tem uma preferência por ambientes com pouco estímulo (exemplos de estímulos: muitas pessoas, uma festa barulhenta, etc). E, é interessante notar também que apesar de muitas vezes andarem juntas, introversão e timidez não são a mesma coisa. A primeira, já definimos: preferência por ambientes com baixo estímulo. A segunda seria um medo da desaprovação social e de possível humilhação social. E por último (neste parágrafo de definições), é importante frisar que não existe ninguém 100% extrovertido ou 100% introvertido. As pessoas são uma mistura de vários traços de personalidade e de história pessoal.
                              O ideal da extroversão presente na sociedade peca ao não reconhecer que a maioria das grandes invenções da humanidade vieram de pessoas introvertidas, trabalhando sozinhas. Para dar um exemplo, é citado o caso de Stephen Wozniak (que junto com Steve Jobs, viria a criar a Apple). Wozniak criou seu primeiro protótipo de PC trabalhando sozinho em casa lendo manuais de engenharia, e trabalhando até tarde da noite. Na sua autobiografia ("iWoz") ele, inclusive, dá esse conselho aos jovens: trabalhe sozinho.
                               Apesar de tantas pesquisas ressaltando as vantagens de uma personalidade introvertida, e as ligações desta com a criatividade (a solidão cria um ambiente de concentração necessário para a dedicação que tarefas complexas exigem), a sociedade foi e é organizada de forma à valorizar o trabalho em grupo acima de tudo. Esse tipo de ideia foi denominada "Novo Pensamento de Grupo", e este pensamento prega que as consquistas intelectuais vêm de um lugar sociável, e logo trabalhar em equipe é a regra em ambientes formais e educacionais. Algo que impulsionou essa ideia foi a Internet, pois pelo fato de uma variedade de coisas terem sido criadas colaborativamente (Wikipédia, por exemplo), faz-se a conexão (errada) de que em situações "físicas" também deve ser assim. Para que seja possível entender o valor do trabalho individual, podemos citar uma pesquisa feita com músicos de alto nível, e com músicos com um nível mediano realizado pelo pesquisador e psicólogo Anders Ericsson. O objetivo era verificar o que fazia os músicos de alto nível se destacarem tanto em seus campo. E o que se descobriu era que esses músicos passavam a maior parte de seu tempo praticando sozinhos. Nesse estudo solitário, eles identificavam onde estavam seus pontos fracos e podiam exercitá-los (diferente de quando se está em grupo, e só se reforça os pontos onde já se tem proficiência). Esse tipo de prática foi chamada de Prática Deliberativa. Até a tão consagrada ideia do brainstorming já foi alvo de pesquisa. E por incrível que pareça, os estudos demonstraram que realizar um "brainstorming" sozinho rende mais e melhores ideias do que quando realizado em grupo. As razões para isso (e podemos confirmar hoje em dia por meio dos aparelhos modernos da medicina) é que o medo da desaprovação social é algo muito forte, e mesmo com as técnicas formais de brainstorming para evitar julgamentos dos colegas, este medo ainda continua presente.
                       Enfim, o que este texto nos alerta é que essas ideias tão presentes na sociedade como o Ideal de Extroversão e o Novo Pensamento de Grupo, não são apoiadas pelos pesquisadores. Claro que comunicação em uma empresa é importante, assim como incentivar o convívio entre alunos de uma instituição de ensino, mas o que não pode ser feito é uma subvalorização do trabalho individual. E um preconceito com pessoas que tenham uma personalidade com tendência à introversão pode ser muito prejudicial, pois grandes ideias costumam vir delas.

Referência: Cain, S. (2012) O poder dos quietos. Rio de Janeiro: Agir.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Luto & Melancolia

                                                                             


                            Olá, visitantes anônimos. Hoje irei comentar sobre o texto que li esta semana: "Luto e Melancolia" do mais famoso médico da história: Freud. Nunca tinha lido algum texto dele, e nem conhecia sua terminologia, então achei o texto um pouco difícil de entender, mas irei tentar expor algumas das ideias abordadas.
                             Antes da falar do texto específicamente, é interessante falar um pouco do autor. Sigmund Freud nasceu em 1856, se formou em Medicina, e é considerado o criador do campo de investigação denominado Psicanálise. As contribuições de Freud são inúmeras, mas provavelmente a mais significativa foi o estudo e a atenção dada ao inconsciente. Nesse texto, Freud investiga o estado da melancolia, procurando entender suas causas, e comparando com o estado do luto, que é semelhante, porém não é considerado patológico. É importante notar, que Freud diz no começo do texto, que essa é uma investigação, e não deve ser considerada com verdade universal:

"[...]renunciamos de antemão a reivindicar validade universal para nossas conclusões e nos consolamos com a consideração de que, com nossos atuais meios de pesquisa, dificilmente descobriríamos algo que não fosse típico[...]"

                             Para investigar a melancolia, primeiro analisa-se o luto. Este estado seria um reação à perda de uma pessoa querida e seria caracterizado e teria como causas elementos muito parecido com os do estado de melancolia. Desinteresse, desânimo, perda de energia, seriam sintomas em ambos. A diferença é que no estado de melancolia há um rebaixamento da auto-estima. Além disso, nesse último estado nem sempre se tem consciência do que perdeu. 
                              Para explicar esses estados mentais, entram os conceitos de libido e ego. A libido seria a energia que nos impulsiona na vida, enquanto o ego seria o "eu", o componente psicológico da personalidade. No caso do luto, quando alguém perde uma pessoa querida, toda a libido relacionada àquela pessoa precisa ser retirada, só que há um resistência contra esse movimento, gerando então, um estado de luto. No caso da melancolia, é muito comum a pessoa se criticar, e fazer uma série de auto-recriminações. A explicação para isso seria que após sofrer uma decepção (ou algo parecido) com um objeto/ser a "imagem/sombra" do objeto cairia sobre o ego, dividindo este em dois: um instância crítica e uma instância que se identifica com o objeto. Então, quando a pessoa está se criticando ela está na verdade criticando a pessoa que causou essa decepção. Daí, se explica a baixa auto-estima, e também seria uma pista para os casos de suicídio (destruição do ego seria possível pois estaria tratando-se como o objeto perdido).
                              Portanto, o estado da melancolia poderia ser caracterizado por uma perda de um objeto ou abstração e uma reação frente à esta. Além disso, esse estado pode ser chamado de ambivalente pois há um "amor" pelo objeto e críticas/insultos em relação ao objeto. E por fim, deve ser considerado a ideia de regressão da libido para o ego, que explicaria alguns comportamentos.

                             Em época de estudos intensos de neurologia e como explicar tudo por meio do cérebro, Freud foca nos estudos do inconsciente e como podemos explicar nossos comportamentos por meio dele. Suas ideias influenciam até hoje a psicologia e são de grande valor.

Referência: Freud, S (2012) Luto e Melancolia. São Paulo:Cosacnaify

                                                                                           

domingo, 12 de outubro de 2014

Educação da mente

 

                           O texto que irei comentar essa semana é sobre um estudo realizado na Universidade de Wiscosin, com um monge tibetano. O objetivo da pesquisa era de estudar este monge em diferentes estados mentais (os quais ele consegue atingir após anos de treinamento) e descobrir se é realmente possível treinar nosso cérebro a lidar melhor com emoções destrutivas.
                           A ideia para a pesquisa surgiu em Dharamsala, em um diálogo entre Dalai Lama e um seleto grupo de cientistas. Nesse diálogo, temas como educação da mente, auto-administração emocional e propostas de pesquisa foram analisados. Richard Davidson, que participou desse diálogo, convidou o monge Oser para fazer parte do estudo. Oser, que se converteu ao budismo e passou mais de 30 anos recebendo a educação de monge tibetano no Himalaia, se mostrou deveras cooperativo e interessado nos exames e resultados da pesquisa. O objetivo de Davidson era estudar Oser pelos modernos equipamentos de análise científica para observar se estados cerebrais distintos são realmente possíveis de serem antigidos por meio da meditação.
                         Ao longo de seu extenso treinamento, Oser aprendeu uma série de estados diferentes de meditações. A equipe escolheu (junto com Oser), para a primeira bateria de testes, três estados específicos: 

                         1) Concentração em um ponto: nesse estado, é necessário focar em apenas um alvo, deixando todos os outros pensamentos de lado.
                         2) Compaixão: para esse estado, é necessário levar à mente o sofrimento dos seres vivos, e o fato de que todos querem a felicidade.
                         3) Visualização: construir um imagem mental completa de um deidade budista.

Nessa primeira bateria de testes, Oser foi analisado utilizando o equipamento fMRI e utilizando um medidor de ondas cerebrais. Com esses equipamentos, é possível ter uma ideia do que acontece durante cada ato mental. A análise dos resultados indicou que Oser conseguia, voluntariamente, regular as atividades do cérebro por meio de processos mentais. Além disso, também observou-se que o monge apresenta uma alta atividade cerebral em locais do cérebro associados à emoções positivas.
                        Outros testes também foram realizados e os resultados foram muito interessantes:
                        a) Oser e meditadores são melhores em reconhecer expressões faciais (demonstrando uma capacidade incomum para empatia)
                        b) Oser conseguiu suprimir o reflexo do susto (um reflexo muito intenso do susto indicaria uma maior propensão à emoções negativas)
                        c) Em análise de discussões, o monge conseguiu se manter calmo e racional
                        
(É interessante notar que pesquisas como esta que estudam emoções positivas são raras, a maioria foca no estudo de estados mentais negativos como depressão e ansiedade).

                        Enfim, a pesquisa com o monge foi de grande valor, pois demonstrou o conceito de neuroplasticidade, isto é, a capacidade do cérebro mudar em consequência de novas vivências. No caso de Oser, anos de treinamento nas artes de meditação e budismo o tornaram capaz de manipular seus estados mentais de uma forma bastante nítida, além de faze-lo mais propenso à emoções positivas.
                         Pesquisas como esta levam à uma reflexão sobre a forma com que a mente é tratada hoje em dia. A indústria de fármacos movimenta bilhões de reais todos os anos para muitas vezes nem conseguir trazer um benefício real para o paciente (sem contar todos os efeitos colaterais). Apesar de trabalhoso, métodos de meditação ou semelhantes, podem ser um caminho alternativo ou complementar para o tratamento de quem sofre de algum tipo de desconforto mental (ou mesmo para quem não sofre, mas quer ter uma melhor qualidade de vida). 

Referência: Lama, D. e Goleman, D. (2003) Como Lidar Com Emoções Destrutivas. Rio de Janeiro: Campus Ltda

domingo, 5 de outubro de 2014

Suicídio de Idosos em Teresina


                O suicídio é um problema mundial de saúde pública. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a média de suicídios aumentou em 60% nos últimos 50 anos. Estudar esse assunto é deveras importante, pois estima-se que a maioria dos suicídios que ocorrem a cada ano poderiam ser evitados.
                Um grupo que merece atenção especial são os idosos pois, de acordo com um estudo feito em 62 países, as taxas de suicídio aumentam com a idade. No Brasil, em 2007, a taxa na população idosa foi de 8,0 / 1000. O texto que irei comentar essa semana foi um estudo feito com o objetivo de descobrir os fatores que levaram cinco idosos à cometerem suicídio. Para isso, familiares e amigos próximos do falecido foram entrevistados.
                 Após fazer a chamada autópsia psicossocial desses cinco idosos que tiraram a própria vida, foi possível fazer um levantamento sobre causas em comum, e sobre pontos importantes que devem ser comentados e estudados. Pode-se notar uma angústia relacionada ao envelhecimento. No caso da "Joana", existia uma rejeição ao envelhecimento e uma busca incessante por uma aparência jovial. No caso de "Ana", ela sentia-se um peso para as pessoas ao seu redor. Personalidades impulsivas também foram uma característica comum nesses casos. Aliados à isso, o uso excessivo de álcool pode ser fatal, pois diminui a capacidade de segurar os impulsos. Além desses motivos, também se notou que em quase todos os casos, conflitos familiares estavam presentes. Finalmente, doenças físicas e transtornos mentais como distúrbios do humor e depressão também estavam presentes em parte dos casos. Enfim, "autópsias psicossociais" são de um imenso valor, pois é possível identificar elementos em comum, e com isso evitar casos semelhantes no futuro.
                Além de fatores em comum, outros pontos também se destacaram no estudo. Primeiro, seria sobre o valor dual da mídia nesses casos. Ao mesmo tempo, que é necessário divulgar o problema do suicídio para que mais pessoas estudem o assunto e para que mais pessoas busquem ajuda caso estejam em um quadro semelhante, a mídia também pode servir de estímulo para novos casos. É necessário pois, tratar o assunto de forma delicada, mas sem deixar com que vire um tabu na sociedade. Outro ponto importante de se comentar é o mito de que "quem quer se matar não avisa", ou seja, quem preconiza a própria morte estaria somente fazendo uma ameaça. Isso é um grande mito, pois de acordo com Werlang & Botega (2004), dois terços dos que cometeram suicídio comunicaram de alguma forma seus familiares ou amigos próximos.
                 Ao se entrevistar a família desses idosos, também se observou que o dano causado na família foi imensurável. O suicídio de um familiar afetou de várias formas todos que conviviam com ele. Culpa por não ter acreditado que iria acontecer, a falta de respostas são alguns resultantes. Observou-se até um desenvolvimento de um quadro de suicídio em alguns dos familiares, como comentou a ex-esposa de Carlos:

"Acho que o suicídio do meu filho é uma questão de tempo. Ele está em um estado tão crítico do alcoolismo que às vezes não reconhece a gente, delira e acorda gritando de madrugada. Ele nunca conseguiu se conformar com a morte do pai, seu grande herói. Ele sempre me disse que amava mais o pai do que eu"

                  Enfim, lendo esse texto pode-se concluir que o suicídio é um fenômeno construído e potencializado ao longo da vida de um indivíduo que teve uma vida marcada por sofrimentos. Normalmente, o ato acontece quando não se vê outra saída e é potencializado por uso excessivo de álcool e por transtornos mentais. Além disso, o dano causado em familiares é imenso.
                   Há uma tendência muito grande de não comentar o assunto, ou seja, ele é um tabu na sociedade atual. Mas discuti-lo é importantíssimo, pois assim pode-se identificar e prevenir casos futuros (metade dos que se mataram falaram com profissionais da área da saúde um mês antes da morte).

Referência: Servio, S.M.T. e Cavalcante, A.C.S. (2013) Retratos de autópsias Psicossociais sobre suicídio de idosos em Teresina. Psicologia: ciência profissão, 33, 164-175

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Psicose Maníaco Depressiva


                           Hoje, irei comentar o texto de uma aluna de enfermagem que relata sua experiência ao acompanhar uma paciente com transtorno bipolar.
                           A psicose maníaco depressiva (transtorno bipolar) é um quadro em que a pessoa irá oscilar entre diferentes estados mentais. Na fase "maníaca", o paciente tende à apresentar um humor aparentemente melhor, uma euforia muito grande, ideias "grandiosas" e pensamento acelerado. Em uma fase "mista" o paciente parece passar por uma fase de aparente tranquilidade (nos pacientes de ciclagem rápida, não há essa fase). E finalmente, a fase "depressiva" em que a pessoa de sente desinteressada e desanimada, tem pensamentos tristes, e ideias de suicídio.
                         De qualquer forma, apesar de ser importante dar uma ideia do quadro bipolar, a ênfase do texto não está no quadro de doença mental e sim na relação cuidador-paciente e nos sentimentos do cuidador. É importante, por exemplo, que o enfermeiro seja compreensivo com o paciente, estimule a expressão de suas ideias e opiniões. Podem ser utilizadas técnicas terapêuticas também para facilitar o processo de comunicação. E sempre valorizar qualquer progresso do paciente, ajudando-o a tomar decisões.
                        Nesse processo de cuidar de um paciente bipolar, o cuidador enfrenta um série de dificuldades. Na fase "maníaca", a agressividade e agitação do paciente dificulta seu tratamento e ele deve ser colocado em locais com pouco estímulo. Na fase depressiva, há um desânimo e falta de cooperação do paciente, e para garantir sua segurança é preciso tentar socializá-lo.
                         A autora do texto relata a experiência em que teve ao tratar uma senhora de 61 anos portadora de psicose maníaco depressiva. Ela foi internada depois de ser observada vagando à noite por um rodovia batendo nas janelas das casas que encontrava. O primeiro contato da aluna de enfermagem com a paciente foi em uma fase depressiva, em que a paciente andava cabisbaixa e devagar, e pouco interagia. Então, a estudante utilizou técnicas terapêuticas do tipo verbalizar interesse e aceitação, chamá-la pelo nome e repetir suas últimas palavras. Já na fase seguinte (maníaca) a paciente ficava alegre e falava com qualquer um que encontrava, andava rápido, ficava inquieta, falava vários assuntos ao mesmo tempo, tinha insônia e uma desorientação no tempo/espaço. A estagiária em enfermagem também utilizou técnicas terapêuticas para ajudar no processo de cuidar da paciente, do tipo impor limites e pedir que a paciente explicasse mais seus assuntos. Portanto, há dificuldades em ambas as fases. Na primeira (depressiva) é difícil interagir com o paciente, além de que a depressão deste tende a afetar a equipe que está tentando ajudá-lo. E quando muda-se de fase, há um sentimento de que é preciso começar tudo de novo, pois os sintomas mudam drasticamente.
                       Enfim, o que o texto mostra é que cuidadores também passam por várias dificuldades ao tratar pacientes, independente de qual seja seu diagnóstico. Sentem desânimo, impaciência, irritação. Além disso, o texto demonstra que o processo de comunicação é muito importante pois é por meio deste que o paciente irá expressar seus sentimentos e ideias e assim fica mais fácil traçar um plano individual de melhora. E por fim, esse trabalho demonstra que quanto mais um profissional lida com pessoas, mais psicologia está envolvida. É claro (depois de um ler texto desse pelo menos!!) que um profissional de enfermagem acaba entrando em contato com ideias de psicologia para melhorar seu trabalho e também para lidar com seus próprios sentimentos. Mas qualquer que seja a profissão, tendo fator humano envolvido (quase todas!!!) um pouco de psicologia é sempre bem vindo.

Referência: Martins, L.M.M. (1999) Assistência de enfermagem a pacientes com desordem bipolar e sentimentos da estudante de enfermagem: estudo de caso. Revista da Escola de Enfermagem da USP, 33, 421-427.

domingo, 21 de setembro de 2014

Curva gaussiana & Carl Rogers


                    O primeiro texto que irei comentar hoje é um boletim do Instituto de Física da USP em que se compara uma avaliação por critério e uma avaliação por norma (utilizando a famosa curva gaussiana).
                    Quando um professor utiliza a curva gaussiana para avaliar seus alunos, ele está comparando cada aluno com a média da turma. O problema, propõe o professor que escreveu o boletim, é que fazendo uso dessa forma de avaliação o docente não consegue aferir se o aluno realmente aprendeu o que deveria em um determinado módulo, por exemplo. A alternativa, então, seria uma avaliação por critério, em que o aluno seria avaliado individualmente e sua nota seria proporcional ao quanto ele demonstrou saber do conteúdo ministrado.
                    Para reforçar a tese, o boletim cita uma pesquisa educacional feita com alunos de física em que estes tinham que resolver uma série de experimentos. O diferencial da pesquisa era liberar o parâmetro tempo dos alunos, além do material de ensino (auto-instrutivo) ser de alta qualidade. Quando analisaram os resultados, observaram que a maior parte dos alunos tinha tido resultados excelentes. Essa pesquisa demonstrou que se o fator tempo fosse mais flexível, os alunos conseguiriam demonstrar melhor seus conhecimentos.
                   Na minha opinião, esse texto põe em evidencia uma ideia importante que é a ideia de que há um incompetência por parte do sistema de ensino em avaliar adequadamente o aluno (a pesquisa demonstrou que com bons materiais, e com tempo adequado, os alunos conseguem ir bem). Porém, o texto peca ao ser muito tendencioso para o lado da avaliação por critério. O professor parte da premissa que uma avaliação que use a curva gaussiana não está sendo adequada em termos de estratégia de ensino, e uma avaliação por critério seria então mil maravilhas. Mas basta uma olhada em qualquer instituição de ensino para ver que isto não é verdade. Uma avaliação que utilize curva gaussiana pode inclusive proteger o aluno da incompetência de docentes que não têm habilidade em ensinar e muito menos em avaliar alunos. A curva gaussiana, avaliando sempre a média da turma, evita problemas do tipo um professor cobrando a matéria de uma forma que não condiz com o que ensinou. Além disso, não é por que utiliza-se a curva gaussiana que a estratégia de ensino necessariamente é rígida. Pode-se também liberar o parâmetro tempo, por exemplo, nessa forma de avaliação.
                 Enfim, o problema educacional é muito maior do que a forma de avaliação de ensino utilizada. Uma avaliação por critério definitivamente não garante uma boa estratégia de ensino. Muito antes de estudarmos formas de avaliação de alunos, é preciso ir até a raíz do sistema de ensino e corrigir suas falhas. Aí então, poderemos discutir se a curva gaussiana deve ser utilizada ou não.

Referência: Dib, C.Z. (2002) Afinal, o que você efetivamente mede quando sua avaliação é referenciada pela distribuição normal ? Boletim informativo do instituto de Física da USP. http://www.if.usp.br/bifusp/bifold/bif0218.html
                   

                     Bom, o outro texto que vou comentar aqui é um texto que expõe as ideias do psicólogo americano Carl Rogers, com ênfase em suas ideias sobre educação.
                     Carl Rogers foi um psicólogo americano que desenvolveu um método terapêutico chamado "Abordagem Centrada na Pessoa". Essa abordagem segue uma série de conceitos em que a ênfase está na pessoa sendo avaliada e não no avaliador. Esse método segue conceitos que dizem que há um tendência da personalidade humana ao bem estar, ao desenvolvimento das suas potencialidades. Ou seja, o indivíduo tem recursos e autonomia para alterar suas atitudes. Além disso, essa abordagem também diz que a forma em que se dá o processo de comunicação entre os indivíduos também é importante para que haja um crescimento pessoal. Aceitar as opiniões individuais, se colocar no lugar do outro, ser autêntico na relação leva aos participantes do processo de comunicação à aceitaram a si mesmos, descobrir seus objetivos e traçar metas realistas para alcançá-los.
                     É fácil de ver que esta abordagem pode ter valor em outras áreas também, não só na psicologia clínica. E então, nasce a "Abordagem Centrada no Aluno". Aqui, é proposto que a ênfase do sistema de ensino saia da figura professor e passe para o aluno. O foco deve ser facilitar o processo de aprendizagem e crescimento pessoal e não um ensino copia-reproduz que se observa na maioria esmagadora das instituições de ensino. O assunto deve ser relevante ao aluno ("há uma tendência do indivíduo de desenvolver suas potencialidades"). O aluno deve participar ativamente do processo de ensino. E para todas essas ideias funcionarem adequadamente o professor deve ser um facilitador de aprendizagem, seguindo os conceitos de uma relação de comunicação saudável. Ou seja, o professor deve ser autêntico (mostrar-se como pessoa), aceitar o aluno e suas opiniões, compreender o aluno. Enfim, aprendizagem deve ser um processo em que o o professor é um orientador e que deve facilitar o crescimento do aluno como indivíduo.
                     É triste de comparar as ideias de Carl Rogers com a forma como a aprendizagem é tratada normalmente (professor sendo uma figura de autoridade e alunos repetindo conhecimento). A forma tradicional de ensino está ultrapassada e conceitos como estes poderiam aumentar o gosto dos alunos por aprendizagem. Algum dia, uma mudança tem de acontecer.

Referência: Capelo, F.M. (2010) Aprendizagem Centrada na Pessoa: Contribuição para a compreensão do modelo educativo proposto por Carl Rogers Revista de Estudos Rogerianos, A Pessoa como Centro, no. 5.

domingo, 14 de setembro de 2014

Baixo desempenho escolar


                    Olá visitantes do blog, hoje irei comentar um estudo feitos por alunos do Mestrado em Psicologia da UFPE. Esse estudo tem como objetivo buscar as origens de um baixo desempenho escolar (com enfoque em classes sociais mais baixas).
                    Quando se fala em baixo desempenho escolar, há uma série de estudos que foram feitos sobre o assunto, e cada um com uma linha de pensamento diferente. Temos estudos que associam um fracasso escolar à uma privação cultural que culminaria em uma deficiência cognitiva no futuro. Há os estudos que associam um baixo desempenho escolar ao fato de uma desvalorização do estudo em classes sociais mais baixas, pois o trabalho precoce é comum nesse setor da sociedade. Há ainda os defensores do argumento de que o próprio sistema favorece classes sociais mais altas (colégios particulares vs colégios públicos, por exemplo). Mas, uma linha de pensamento que não tem tantos adeptos é  a linha que diz que o fracasso escolar vêm da escola em si, que não consegue se adaptar aos diferentes tipos de estudantes. Com os dados deste estudo, essa última linha de pensamento ganha muita força.
                     O estudo consistiu em observar o desempenho de crianças de classes sociais mais baixas em testes de matemática. Mas o que diferencia este estudo de outros similares é que aqui, foram aplicados dois tipos de teste, o formal e o informal. No teste informal, as crianças são expostas à perguntas de matemática que estão inseridas em um contexto (por exemplo: "se 3 sucos são 35, quanto são 10 sucos?"). No teste formal, essas crianças são expostas às mesmas perguntas mas colocadas em forma de operações secas do tipo "quanto é (35 / 3) x 10?". Os resultado são impressionantes! As crianças acertam muito mais as questões do teste informal, ou seja, o contexto é um fator importantíssimo ao se aferir a capacidade (nesse caso aritmética) de um aluno. Além disso, essas crianças de classe social mais baixa, também demonstraram ser muito melhores em realizar contas de cabeça (dividindo o problema em sub-problemas por exemplo) do que escrevendo essas contas em papel e escrevendo um numero embaixo do outro, fazendo vai-um, etc. Ora, na escola são avaliadas de que forma? Com operações secas e tendo de escrever em papel e de realizar contas de formas não intuitivas!
                     Esse estudo indica que as escolas não conseguem realmente aferir a capacidade real dos estudantes. Ensinando de forma estática e  não-natural, estudantes de classe social mais baixa podem ser tidos como tendo uma baixa capacidade escolar, quando na verdade só estão acostumados à uma forma diferente de pensar. A escola costuma ensinar operações matemáticas secas e tenta depois inseri-las em contextos. Seria muito mais produtivo fazer o contrário.

Referência: Carraher,T.N., Carraher, D.W. e Schliemann (1982) Na vida dez, na escola zero. Cadernos de Pesquisa, 42,79-86 

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Sobre o tato e sobre o tédio


                        Nosso sistema sensorial é a parte do nosso corpo responsável pelo processamento de informações sensoriais. Para isso, é necessário traduzir as percepções do mundo físico para a mente. É então que entra o conceito de sentidos (visão, audição, tato, paladar e olfato). Mas, apesar de conhecermos bem os cinco sentidos, quando pensamos em áreas de pesquisa, o último que consideramos é o sentido do tato (os primeiros sendo visão e audição). Podem ser citados vários motivos para poucos pessoas no mundo estudarem o tato, mas o fato é que a sociedade poderia melhorar muito tecnologicamente se mais pesquisadores se dedicassem à essa área.
                        Como exemplo de tecnologia criada a partir do estudo do tato, pode-se citar o macacão táctil de pilotagem criado por Angus Rupert (médico da NASA). Com essa "roupa", o piloto recebe informação tátil sobre o ambiente (altitude, inclinação) e reage instintivamente aos "pulsos". Com essas informações, a pilotagem fica bem mais segura pois o piloto não depende apenas de informações visuais. Esse tipo de tecnologia aliado à tecnologia de radares também pode ser incorporado em veículos terrestres para avisar o motorista quando algo estiver muito próximo do veículo. Além disso, essa tecnologia pode ajudar deficientes visuais à se guiar, e à deficientes auditivos (o cérebro pode ser treinado à receber sons pela pele!)
                        Enfim, o sentido do tato pode trazer uma série de benefícios para sociedade. Mas por não ser uma área tradicional de pesquisa (além da falta de uma grande indústria que apoie esse desenvolvimento), cria-se uma barreira para inovações tecnológicas que poderiam mudar nossas vidas.

Referência: Schrope, M. (2001). O novo sentido do tato, New Scientist, 2 de Junho, 30-33.


                        O outro texto que eu li essa semana é o texto "Patologia do Tédio". Esse texto também trata de uma área de pesquisa não-tradicional: o tédio. Como nosso corpo reage à momentos de monotonia? 
                         Pesquisadores perceberam que organismos param de responder à estímulos repetitivos após um certo tempo. Em um experimento, pediu-se para pessoas observarem um ponteiro e pressionassem um botão sempre que o ponteiro desse um pulo duplo. A eficiência dos participantes do experimento diminui depois de meia hora!. Em outro experimento (mais complexo) os participantes usaram visores, luvas e travesseiros para evitar estimulação perceptual e foi feito uma série de testes para observar seus desempenhos antes e depois do experimento. Os resultados foram impressionantes. Primeiro, observou-se que as pessoas que estavam participando do experimento tinham uma capacidade de concentração bem menor depois de um tempo de monotonia. Além disso, vários participantes relataram que estavam sofrendo alucinações. E vários se diziam confusos após o experimento.
                         Esse tipo de pesquisa demonstra que nosso cérebro depende de estímulo constante para funcionar corretamente e mostra que para nos sentirmos com energia precisamos estar envolvidos em atividades que consideremos interessantes. 
                         Estudos como esse também podem servir como fonte de explicação para alguns acidentes envolvendo motoristas de caminhão ou pilotos que após muito tempo realizando a mesma atividade monótona relatam ter tido algum tipo de alucinação que fez com que fizessem movimentos abruptos e que não fariam caso estivessem tão concentrados quanto estavam no começo do percurso. 

Referência: Heron, W. (1977) A patologia do tédio. Psicobiologia: as bases biologicas do comportamentoRio De Janeiro: LTC.

domingo, 31 de agosto de 2014

Modulação da Mente


                       É impossível parar o avanço da tecnologia. Independente de qual seja a área de estudo, se algo pode avançar cientificamente falando, ele irá. Apesar desse ser um aspecto importante da ciência (não ser completamente regulada politicamente), em áreas como a neurociência, em que substâncias podem mudar completamente uma pessoa, e que grandes empresas estão sempre atrás de criar novos remédios para lucrar mais, isso pode se tornar um problema.
                        As "poções mágicas" que dizem melhorar funções cognitivas vem sendo comercializadas há bastante tempo. Em 1970, Cornelius Giurgia já dizia "não precisamos esperar a evolução parar ter um cérebro melhor!". Só que essas substâncias, na maior parte dos casos, são vendidas sem se conhecer suficientemente a forma como agem no cérebro.
                        Um grande incentivador para a venda dessas drogas que dizem melhorar algum aspecto cognitivo (memória, por exemplo) é o medo da população. O aumento da idade média da população, e o Mal de Alzheimer afetando uma certa porcentagem de idosos, faz com a população demande dos cientistas algum tipo de "neuroproteção". Um exemplo de demanda da sociedade é a demanda por remédios que evitem a perda de memória. O problema é que a memória é um aspecto cognitivo complexo, e que não lembrar de determinados fatos (filtro de informação) faz parte desse mecanismo. Então, não é simplesmente o fato de achar um remédio que faça alguém não esquecer nada, deve-se achar e estudar remédios que evitem o declínio da memória, por exemplo. Além disso, muitas vezes vende-se remédios sem citar todos os efeitos colaterais resultantes do seu uso.
                       Outro tipo de remédio que sociedade demanda dos neurocientistas são os remédios que melhorem a aprendizagem. Assim como a memória, aprendizagem se liga à várias áreas do cérebro, então não é fácil definir um escopo específico para a substância. Além de (de novo) todos os efeitos colaterais que esses remédios podem trazer. O uso de drogas que melhorem a aprendizagem também levante uma questão ética. A Agência Mundial Antidoping cita uma série de substâncias que os atletas não podem usar, pois se o fizessem estariam em uma vantagem desleal em relação à seus colegas de esporte. Então, será que no futuro um candidato poderá ser processado se passa em um concurso público (por exemplo) e depois se descobre que ele estava usando substâncias que melhoravam sua cognição?
                       Uma substância que levanta bastante polêmica quanto à questão ética envolvida no seu uso é a Ritalina. Essa substância que diz melhorar os sintomas do déficit de atenção é considera por alguns uma droga perversa e por outros uma salvação. Um dos aspectos polêmicos do uso da Ritalina aparece quando se observa como o chamado "déficit de atenção" é tratado diferentemente comparando Estados Unidos e Reino Unido. Nos EUA, o déficit de atenção têm uma taxa de incidência bem maior que no Reino Unido apesar de alguns cientistas alegarem que a doença tem um fator hereditário muito forte. Outro ponto que chama atenção no uso dessa droga é que em grande parte dos casos, a pressão para receitá-la à uma criança vem dos pais e professores, e não de psiquiatras. Deveria se estudar melhor o caso de cada criança, já que ela pode ser diagnosticada com déficit de atenção por se mostrar irrequieta em sala de aula, mas na verdade ela pode simplesmente não gostar uma aula específica, por exemplo. Além do mais, é preciso lembrar que a Ritalina não cura o déficit de atenção, mas simplesmente diminui seus sintomas.
                  
Referência: Rose, S. (2006) O cérebro no século XXI: como entender, manipular e desenvolver a mente. São Paulo: editora Globo. (capítulo 10)

domingo, 24 de agosto de 2014

Desenvolvimento da Psiquiatria


                       Basta uma olhada no "Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais" (quase mil páginas) para se ter uma ideia da complexidade do campo da psiquiatria. A dificuldade de diagnosticar doenças mentais e tratá-las remonta à bastante tempo atrás.

                        O temperamento humano já foi visto como uma mistura de humores básicos e doentes mentais já foram tratados como se estivessem possuídos por maus espíritos. Mas foi no fim do século XIX que sintomas de doenças mentais começaram a ser rotulados e sanatórios começaram a aparecer por toda a parte. A partir daí, e até os tempos de hoje, há uma grande discussão em torno do tratamento de doenças mentais.

                      Um experimento que demonstra o quanto a psiquiatria precisa evoluir e re-avaliar seus métodos foi o experimento conduzido por David Rosenhan em 1973 (recente!!). Ele e mais sete voluntários se internaram em diferentes hospitais alegando ouvir uma voz repetindo "thud". Mas assim que foram internados passaram a se comportar de forma perfeitamente normal e mesmo assim seu comportamento foi tido como anormal, e levou bastante tempo até que tivessem alta de fato. A classe psiquiatra desafiou Rosenhan a enviar mais pseudopacientes alegando que conseguiriam identificá-los. No mês seguinte, alegaram ter identificado 41 pseudopacientes, mas Rosenhan revelou que não enviou nenhum.

                   Mas, voltando a história.
                   No século XX, a busca por terapias para tratar distúrbios mentais levou também cientistas da época a quererem moldar o comportamento humano. Skinner foi um dos fundadores da psicologia behaviorista, que se baseia na ideia de moldar alguém por meio de recompensas e castigos.
                   O avanço da tecnologia, porém, levou à métodos mais invasivos. Em 1949 Egaz Moniz levou o prêmio Nobel por cortar os tratos que conectavam o lobo frontal com o córtex. Esse método, diziam, deixava os pacientes "mais calmos".

                  Apesar da chamada "psicocirurgia" ainda acontecer (por exemplo, retirar as amígdalas de indivíduos agressivos pois elas eram tida como causa desse comportamento) em 1950, esse metódos mais invasivos começaram a ser substituídos por substâncias psicoativas. A partir daí, o uso de remédios seria cada vez maior, e suas consequências nem sempre devidamente avaliadas.

                 Testes clínicos com depressão mostraram, por exemplo, que boa parte dos pacientes com depressão que estava recebendo placebo melhorava, enquanto parte dos pacientes que recebiam a droga de fato não apresentavam melhora, ou até mesmo pioraram.
                 O problema reside no fato de que a introdução de uma substância química no corpo leva à uma série de mudanças e as pessoas são diferentes bioquimicamente.

               A indústria de psicotrópicos (drogas que alteram nosso cérebro) está repleta de problemas. Primeiro que o corpo tende a se ajustar às drogas fazendo com que sejam necessárias doses cada vez maiores. Além disso, o tempo de uso de um remédio deve ser cuidadosamente escolhido para não levar ao vício. O maior problema, porém, está no fato de que várias substâncias são vendidas como se resolvessem uma gama enorme de problemas mentais fazendo com que pessoas no mundo inteiro usem-na sem a devida precaução. Hoje sabe-se que o Valium (utilizado bastante em 1970 e era receitado para problemas genéricos como estresse ou infelicidade) têm seus problemas e causa dependência. Um dos problemas dessas drogas é que nem sempre revelam as causas do problema, mas se limitam à diminuir a intensidade dos sintomas.

              Uma classe de remédios que recebeu grande atenção da indústria farmaceútica são aqueles que afetam o sistema da serotonina. Esses remédios se tornaram os favoritos para tratamento de depressão. Uma vantagem desse tipo de remédio é que é possível testar sua eficácia de forma mais objetiva. Mas, o interessante é que observou-se que pacientes que passam por uma psicoterapia muitas vezes têm o mesmo efeito no corpo que aqueles que receberam a medicação.

             O passo seguinte na indústria de fármacos foi o desenvolvimento de inibidores seletivos de recaptação de serotonina. O mais famoso deles é o Prozac. Essa droga passou a ser usada mesmo por pessoas que não eram diagnosticadas como clinicamente depressivas. A euforia não durou tanto, quando começaram a perceber que só um terço dos pacientes que usavam Prozac melhoravam, além de todos os efeitos colaterais.

            Enfim, podemos observar que a psiquiatria está longe de ser exata, e que o uso de remédios para tratar os chamados distúrbios mentais deve ser feita de forma extremamente cuidadosa. Afinal de contas, ninguém pode garantir que algum remédio prescrito hoje de forma irresponsável, pode ser dado no futuro como causador de uma série de problemas, e quem sabe até proibido.



Referência: Rose, S. (2006) O cérebro no século XXI: como entender, manipular e desenvolver a mente. São Paulo: editora Globo. (capítulo 9)

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Psicologia da interação social



               Viver em sociedade significa, entre outras coisas, interagir com outras pessoas. O estudo dessa interação social revela uma série de características interessantes sobre os seres humanos.
               Uma característica comum observada na sociedade são os preconceitos que as pessoas têm sobre um determinado grupo social, por exemplo. Além de preconceitos, é comum também deduzirmos a personalidade das pessoas a partir de alguns traços ou atitudes que observamos nelas.
               Deduzir personalidades a partir de certos traços, ou ter preconceitos em relação à determinados segmentos da sociedade revela que estamos o tempo todo analisando as pessoas e formando opiniões acerca delas. Nesse processo de formação de opinião, é comum cairmos em um erro de atribuição: considerar que nossas falhas têm origem em fatores externos (ambiente, por exemplo) e que as falhas de outras pessoas têm origem em fatores internos (personalidade). Por exemplo, se uma aula de oito da manhã termina muito tarde e, consequentemente, chegamos atrasados na aula de dez não nos sentimos culpados pois atribuímos o nosso atraso à aula anterior. Por outro lado, se estamos em uma aula e observamos um aluno que chega dez ou quinze minutos atrasados, concluímos que ele não é uma pessoa muito pontual.

               Nesse processo de interação social, também influenciamos e somos influenciados constantemente. Essa influência pode se manifestar de diversas formas. Um pai pode por exemplo educar uma criança recompensando-a caso ela siga um comportamento que o pai julga correto ou punindo-a caso ela não o faça. Mas os psicólogos sociais observaram que este tipo de poder não é eficaz, pois a criança tende a seguir o comportamento desejado só quando está sendo fiscalizada. Uma forma mais eficaz de influênciar alguém é usando o poder da informação, ou seja, explicando à pessoa o por quê de algo ser feito daquela forma. Caso a pessoa entenda e concorde, ela irá internalizar aquela informação, e não precisará de fiscalização para seguir aquele comportamento.

              Além desses esquemas sociais, e das diversas formas de influências observadas no nosso dia a dia, temos também uma série de atitudes que seguimos e identificamos em outras pessoas. Essas atitudes podem indicar o comportamento de alguém, mas nem sempre o fazem. Psicólogos sociais observaram que para causar uma mudança de atitude em alguém, razões externas são pouco eficazes. Ou seja, da mesma forma que para influenciar alguém é importante que a pessoa internalize a informação, para que esta mude uma atitude ela deve também mudar internamente sua posição. Uma técnica utilizada é mostrar uma incoerência entre pensamentos que a pessoa têm. Isto causa uma desconforto, que leva à pessoa tentar harmonizar estes dois pensamentos, levando eventualmente à uma mudança de atitude.

            Ainda dentro da área de interação social, uma temática muito interessante de se estudar é agressao. O que faz uma pessoa ser violenta? Genética? Ambiente? Para responder essas perguntas, é preciso primeiro definir o que é agressão:

            "Agressão é um ato com finalidade de causar dano à outrem."

ou seja, estamos considerando agressivos apenas aqueles atos que causam dano de forma proposital. Nesse sentido, observou-se que o comportamento agressivo de uma pessoa deve-se muito à educação que recebeu dos pais. Um filho que observa um pai "estourar" em situações de pressão tende a repetir este comportamento no futuro. Este tipo de conclusão leva à pergunta: "Se o filho tende a repetir o comportamento observado, filmes violentos não deveriam ser restringidos?" Mas a resposta para essa pergunta está longe de ser respondida. Um argumento para o outro lado é que a criança passa por um processo de catárse ao ver desenhos violentos, perdendo a necessidade de descargar uma possível raiva no mundo real.
          
             No outro extremo do comportamento humano estaria o altruísmo. Este também revela traços da personalidade humana. Por exemplo, já ocorreram várias situações onde alguém pede ajuda por um longo período de tempo e ninguém se presta a ajudar. E por outro lado, boa parte dessas pessoas ajudaria esta que estava pedindo ajuda se ela estivesse sozinha. Isto se deve por que quando estamos entre várias pessoas, sentimos que estamos dividindo a responsabilidade de ajudar a pessoa que pede ajuda, e dessa forma nos sentimos menos culpados se não a ajudamos. Por outro lado, se estivéssemos sozinhos, nos sentiriamos muito culpados caso não ajudássemos pois estaríamos com a responsabilidade toda para nós.


 Referência: Rodrigues, A. (1992Psicologia social para principiantes:estudo da interação humanaRio de JaneiroVozes. (capítulos 2,3,4 e 8)